Seguindo as pegadas de outro post, indicamos alguns lançamentos que julgamos interessantes, com pequenas introduções. Deliciem-se (falta-nos modéstia, às vezes).
A incrível história de António Salazar, o ditador que morreu duas vezes (Marco Ferrari): promotor e chefão do Estado Novo (vejam vocês, ditadores em língua portuguesa gostavam um bocado da designação) que governou Portugal no extenso período de 1933-1974, Salazar decidiu o preço do pão e o valor da vida no país até 1968, quando um acidente doméstico o incapacitou para o comando. Ainda assim, espantosamente, seu covarde gabinete jamais lhe falou da destituição, iludindo-o até a morte. Há biografias extensas desta doce figura, mas aqui o foco é a bizarra situação do Manda-Chuva afastado que se imagina com as rédeas da nação em mãos. Patético – nem tanto para os governados, claro. Lançamento: 08 de fevereiro, pela Todavia.
Mussolini: a biografia definitiva (R. J. B. Bosworth): vamos novamente de ditador bizarro, agora com um dos campeões de bizarrice, o homem do queixo permanentemente apontado para cima – que, em um país que não estivesse variando das ideias, jamais seria levado a sério. Com 648 páginas, deve ser leitura cheia de exotismos, pois que creio impossível traçar a história deste bibelô de Hitler sem imaginar uma novela coalhada de inusitados. Daquelas figuras que acabam penduradas pelos pés, e que depois nos obrigam à pergunta: como este sujeitinho medíocre teve tanto poder? O livro traz fontes inéditas, como o diário de sua amante Clara (que acabaria fuzilada junto a ele, em abril de 1945), e passagens reveladoras de seu casamento com Ida Dalser. Lançamento: 06 de fevereiro, pela Globo Livros.

Ioga (Emmanuel Carrère): deixemos os reizinhos de lado e tratemos de outros assuntos. Carrère, autor francês de renome e sempre um provocador de nosso intelecto, apresenta aqui um retrato de sua vida recente, quando decidiu por dez dias em um retiro de silêncio no interior do país para um livro sobre ioga – e foi forçado a interrompê-lo pela morte de um amigo no ataque à redação do Charlie Hebdo, o semanário satírico, em janeiro de 2015. Da meditação ao horror, em 272 páginas. Lançamento: 06 de fevereiro, pela Alfaguara.
Trilogia Autobiografia Viva: Coisas que não quero saber; O custo de vida; Bens imobiliários (Deborah Levy): a autora sul-africana passa a régua em momentos e questões decisivos em sua vida: de uma resposta ao ensaio de Orwell (Por que escrevo) às reflexões de uma mulher de sessenta anos bem-sucedida, passando pelo exílio em Londres (na adolescência, por conta do apartheid), a perda da mãe, um casamento desfeito e a emancipação das filhas. Com o primeiro volume lançado em 2017, e lançamento dos volumes 2 e 3 em 10 de fevereiro e 10 de março, pela Autêntica.
Pessoa: uma biografia (Richard Zenith): este é do finalzinho de 2022, e merece estar aqui. Por quê? Porque é Fernando Pessoa, diabos! Nascido em Washington e desde 1987 vivendo em Lisboa, o ganhador do Prêmio Pessoa em 2012 revolve em 1160 páginas todos os Pessoas: Alberto Caieiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos, entre mais de cem nomes. Com mais de três décadas dedicadas ao escritor português, o autor empreendeu monumental pesquisa, escarafunchando os mais de 25 mil papéis deixados pelo poeta, dramaturgo, prosador, ensaísta, tradutor e crítico literário. Este livro, finalista do Pulitzer 2022 (não venceu, para azar do Pulitzer) e uma das obras do ano em diversas publicações de prestígio, pretende-se o tour de force definitivo das biografias do portuga. Lambuzemo-nos com este calhamaço. Lançamento pela Companhia das Letras, no 14 de dezembro passado.

Um Livro dos Dias (Patti Smith): quando entrou no Instagram a 20 de março de 2018, Patti Smith possivelmente não imaginava (ou sim?) que teria ali material para um livro. Com seu perfil cool-cult, resolveu reunir fotos e textos com reflexões e inspirações em uma obra que traz suas “flechas, apontando para o coração singelo das coisas. Cada uma delas unida a algumas palavras, oráculos soltos. Trezentos e sessenta e seis jeitos de dizer olá”. Com uma página para cada dia do ano, e postagens que vão do chapéu do poeta Lawrence Ferlinghetti ao túmulo de Albert Camus, e da cama de Virginia Woolf à estante de livros de sua casa, temos aqui recortes de uma vida que, reunidos, dão rosto a esta artista que se mexe, remexe e nos leva à boa inquietude. Lançamento em 17 de abril, pela Companhia das Letras.
Submundo (Don DeLillo): nova edição de um dos grandes romancistas norte-americanos do século XX. Com caudalosas 816 páginas, entrega ao leitor um enorme painel do mundo da Guerra Fria e alguns personagens extraordinários, com mais em comum entre si do que podem imaginar. Um artista isolado no deserto, pintando fuselagens de aviões de guerra; um especialista em armazenamento de lixo tóxico; um serial killer com predileção por motoristas; um talento do grafite em uma sociedade atingida pela AIDS. Enfim, o submundo do título, e seus flashes da decadência moderna. Lançamento também em 17 de abril, pela mesma Companhia das Letras.